domingo, 16 de agosto de 2009

O Atraso das Máquinas

Máquina – Todas as mulheres se atrasam.

Homem – Quando penso nisso vejo minha mãe rodando pela sala, louca, procurando entre os milhões de geringonças seus pertences essenciais. Mas faz assim, vira e remexe tudo, procura em milhões de lugares, redescobre o sofá, desmonta a estante e vasculha pela cozinha. Dá voltas e mais voltas em busca de seus preciosos anexos. Quando sai de casa volta pelo menos duas vezes pra verificar se não tem nada faltando, se não deixou de trancar a porta ou se não deixou pra trás o cachorro, ou mesmo as idéias! Ela se perde no meio de tanta sinapse falsa.

Máquina – Mediada por tanta informação, falta-lhe um pouco de condicionamento mental, talvez? Um alinhamento das pseudo-coerências que sobrevoam entre tantas combustões de pensamentos. Há pessoas que não se importam com a hora, ou pelo menos que não se prendem a ela como forma de organização simétrica de suas atividades cotidianas.

Homem – Essa não é a questão, ela quer seguir a hora, mas se prende nas pequenas nuances e acaba por se perder. Ela quer seguir a hora há horas!

Máquina – Ela deve seguir a hora!

Homem – Bela sincronização da vida! Conseguiu o que queria?

Máquina – O que eu queria?

Homem – Maquinificar a essência a partir do teu entendimento!

Máquina – O quê? Falando das mulheres?

Homem – Não. Da relação com o tempo.

Máquina – Não queria nada! Você inventou que eu queria algo. Apenas constatei que as mulheres se atrasam. Invariavelmente sempre. O tempo é medido para funcionar em sociedade, e não seguí-lo acaba por dificultar certos arranjos.



Homem – O tempo é uma prisão na floresta de pedras.

Máquina – Veja bem, as horas servem a certos propósitos. Mais para alguns que para outros. Eu por exemplo, tenho uma coisa engraçada, tudo costuma dar certo pra mim. As coisas entram na engrenagem como se sempre fizessem parte dela.

Homem – Hum...desenvolva.

Máquina – Não tem explicação. Sem motivo qualquer, quando estou dentro de alguma coisa, as portas se abrem sem muita dificuldade. Não é preciso me preocupar, pois já faz parte da minha natureza. Claro que uma boa lubrificação ajuda, quebra o rangir da inércia estática. Mas acaba que sempre perde um pouco do óleo nas engrenagens e volta a ficar difícil uma movimentação.

Homem – Então você deixa enferrujar? Chuta o balde longe?

Máquina – Pois é, mas não importa, acaba que dá certo de novo! Vou pra outra coisa qualquer e pronto, tá lá! Tiro e queda, regulagem perfeita, volta a sensação de encaixe. Quase como a sua mãe, mas ao contrário e invertido.

Homem – Não bota a mãe no meio, que dela falo eu. Se não perde o sentido!

Máquina – Relaxe que a mãe também é minha. Pare de se prender em afecções!

Homem – E você pare de enjaular o tempo!

Um comentário:

  1. hehehe
    massa hein...
    quando eu li 'chuta o balde longe' quase podia ver você falando...

    abs

    ResponderExcluir